Propósito de vida: não precisa ser grandioso, mas deve guiar a direção da vida. Hábitos saudáveis, bem-estar e espiritualidade são essenciais para a longevidade.
Encontrar o propósito de vida é essencial para uma existência plena e significativa. Nobuko Oshiro, aos 75 anos, nos ensina que nunca é tarde para descobrir paixões e se dedicar a elas com intensidade. Seu exemplo nos mostra a importância de seguir aquilo que nos realiza, não importa a idade.
A prática do karatê é o ikigai de Nobuko, sua verdadeira razão para viver. É através desse esporte que ela encontra a energia e motivação necessárias para continuar desafiando a si mesma. Encontrar algo que nos motive diariamente é fundamental para uma vida plena, como nos revela a história inspiradora de Oshiro.
O propósito de vida de Nobuko Sensei
Seu dojo, que recebe alunos de todas as idades, tem as paredes cobertas por fotos suas em diferentes épocas, artigos sobre sua carreira e homenagens recebidas por suas contribuições à arte marcial.Nobuko Sensei, como é chamada, começou ainda jovem e por acaso: praticava uma dança típica de Okinawa, que exigia joelhos e coxas fortes e, para isso, seu professor lhe recomendou o karatê.
Nunca mais abandonou o esporte. ‘Pretendo praticar enquanto puder. O karatê se tornou meu marido, amigo e companheiro’, diz ela, em tom de brincadeira. Mais: tornou-se seu propósito de vida, o motivo pelo qual acorda todos os dias.Os japoneses têm um termo para isso: ikigai, ou razão para viver, na tradução literal.
Ter um propósito de vida foi apontado como um dos fatores responsáveis pela longevidade extrema encontrada nas blue zones.Nobuko Oshiro é a karateka mais bem colocada no ranking em Okinawa, no extremo sul do Japão, uma das regiões em que as pessoas vivem mais no planeta.
Em busca do propósito de vida nas blue zones
Blue zones foi o nome dado a cinco regiões do planeta onde pesquisadores observaram que as pessoas vivem mais do que a média e com saúde. Nesses locais, não é incomum encontrar centenários cuidando do jardim, cavalgando, cozinhando ou trabalhando.
O termo se refere às seguintes localidades:Nicoya, na Costa Rica;Loma Linda, nos Estados Unidos;Okinawa, no Japão;Icária, na Grécia;Sardenha, na Itália.Visitei essas regiões em uma expedição de dois meses para buscar entender esse e outros pilares do envelhecimento saudável – além do propósito de vida, são tratados como pontos fundamentais ter uma alimentação saudável, ser ativo e manter bons relacionamentos.
A importância do propósito de vida na longevidade
Essa é a segunda de uma série de três reportagens que explora essas questões.Continua após a publicidadeEla viajou o mundo atrás dos segredos de quem chegou aos cem anos – e isso foi o que ela descobriuAfinal, o que é propósito de vida?’O propósito de vida é um senso de direção e intencionalidade.
É algo concreto, que pode ser traduzido em objetivos e metas’, explica Cristina Ribeiro, presidente da gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – Seção Paraná, que desenvolveu sua tese de doutorado sobre o tema. ‘Uma pessoa com propósito tem uma direção na vida.
Ela não está vagando, sem saber o que vai fazer.’Estudos mostram que saber por que se vive traz inúmeros benefícios à saúde no envelhecimento.
Uma revisão da literatura feita por um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior paulista, do qual Cristina faz parte, mostrou que idosos que tinham um propósito de vida tinham menos risco para doença de Alzheimer, doenças coronarianas e cerebrovasculares e distúrbios do sono.
Além disso, apresentavam melhor regulação emocional e bem estar de maneira geral.’Quem tem propósito de vida cuida mais da saúde, faz exames regulares, adere mais a tratamentos, porque quer viver mais para atingir seus objetivos’, conta.
Encontrando o ikigai em pequenas coisas cotidianas
Mas e quando não se tem um ikigai tão claro e duradouro, como Nobuko Sensei?
O que especialistas ressaltam é que o ikigai não precisa ser algo grandioso e definitivo.
Ele pode ser simples e particular – um pequeno prazer da rotina diária, que traga alegria, motivação e realização, como receber a visita dos netos, encontrar os amigos ou cuidar do jardim.É o caso Maria Moula, de 93 anos, residente da ilha grega de Icária, uma das regiões com maior número de centenários do mundo.
O que a tira da cama todos os dias hoje é o trabalho em sua horta, espalhada em dois andares no terreno onde mora.Continua após a publicidadeBaixinha, atarracada e falante, Marika, como é conhecida, cuida sozinha das verduras e legumes que cultiva, e dos quais tem imenso orgulho.
Resiliência e espiritualidade nas blue zones
Do outro lado dessa escala está Trinidad Espinoza, de 107 anos, moradora da Península de Nicoya, na Costa Rica, onde se encontra um excepcional número de centenários. Doña Trini, como é chamada, é o oposto de Marika.
Extremamente frágil, move-se com dificuldade e recebe cuidados de sua filha Marta, de 70 anos. As duas vivem em condições precárias, mas Doña Trini quer continuar vivendo, apesar das necessidades.Sua família é a razão porque pede todos os dias a Deus que lhe dê mais anos. Quer estar aqui para poder conviver com seus familiares, espalhados pela Costa Rica – já são quatro gerações depois dela.
Essa resiliência diante das adversidades e a capacidade de se adaptar a novas situações, apontam os pesquisadores, também são consequência de um propósito de vida bem estabelecido.
O papel da espiritualidade nas blue zones
A fé Doña Trini, aliás, é presente na vida da maioria dos idosos das blue zones.
A crença em algo além de si mesmo, seja Deus, os antepassados ou uma força maior, foi identificada como um dos fatores que favorecem uma longevidade extrema e de qualidade.Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Cagliari, na Sardenha, seguiu 95 idosos na blue zone italiana, que é predominantemente rural, e concluiu que aqueles que tinham mais religiosidade usavam-na como forma de lidar com o estresse e, por isso, se mostravam mais resilientes e otimistas.
Esses fatores colaboravam para uma boa saúde mental, já que idosos mais resilientes e religiosos apresentavam maior bem estar de forma geral.Essa mesma pesquisa aponta para um outro aspecto benéfico da fé: o senso de comunidade e acolhimento proporcionado por ela, que se aplica não apenas dentro da própria congregação.
Pesquisadores relatam que as práticas religiosas na blue zone italiana muitas vezes envolvem eventos e apresentações histórias coletivas, que reforçam a identidade social e o engajamento da comunidade, conferindo aos idosos um senso de propósito e pertencimento.Para a italiana Virginia Melis, de 101 anos, a fé é uma prática que carrega consigo desde pequena.
Embora não frequente mais a igreja tanto quanto gostaria, continua a participar das missas de domingo e lê diariamente a Bíblia, onde guarda uma foto de seu falecido marido. ‘Para mim, a graça do Senhor é e sempre será uma grande coisa’, diz.Virginia crê que sua fé a ajudou durante toda a vida, inclusive a chegar à velhice com boa saúde.
Fonte: @ Estadão
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