Troca de letras causa confusão, até Machado de Assis foi vítima. Um cliente achou que um produto Garnier Frères dizia “cagara” em vez de “cachos”, “trouxa” ao invés de “trapos”, perdeu o juízo.
No mundo da tipografia, a troca de uma letra por outra – que pode gerar equívocos e confusões – é conhecida como gralha. Foi exatamente uma dessas gralhas que provocou a indignação de um advogado de Santos/SP nesta semana. Ele disse que acionará a Justiça após receber nota fiscal de uma ótica contendo a descrição ‘cliente trouxa’.
O advogado alega que o erro tipográfico foi um erro grave e que a ofensa não pode ser ignorada. Ele afirma que a gralha foi um ato de desrespeito e que a ótica deve ser responsabilizada por isso. Além disso, ele também destacou que a confusão gerada pela gralha pode ter causado danos à sua reputação e que ele buscará reparação por isso. A Justiça deve ser feita e a ótica deve ser responsabilizada por seu erro.
Erros e Gralhas: Quando a Tipografia Se Torna uma Questão de Respeito
A ótica em questão alegou que o erro foi apenas um equívoco de digitação, que transformou a frase ‘cliente trouxe’ em ‘cliente trouxa‘. Essa simple troca de letras pode ter mudado completamente o significado da informação, tornando-a ofensiva. A gralha, além de prejudicial, parece ser um tiro no pé, gerando termos ofensivos ou vulgares.
Machado de Assis, um dos maiores escritores brasileiros, enfrentou um grande contratempo com um erro tipográfico em sua obra ‘Poesias Completas’, publicada em 1902. A palavra ‘cegara’, na frase ‘lhe cegara o juízo’, foi trocada por um embaraçoso ‘cagara’. O editor de Machado era Baptiste-Louis Garnier, proprietário da editora Garnier Frères, responsável por obras compostas e impressas na França.
A solução encontrada foi a correção manual, livro por livro. Um funcionário da Garnier, Everardo Lemos, sugeriu raspar a letra ‘a’ e substituir pela letra ‘e’, usando nanquim. Entre os bibliófilos, circula a história de que o próprio Machado de Assis teria participado desse esforço coletivo para corrigir os exemplares, ajudando a reescrever a letra.
Erros e Gralhas: Um Problema Recorrente
Alguns livros, no entanto, escaparam da correção manual e foram vendidos antes da intervenção. O segundo lote, que chegou ao Brasil já com a retificação, deu origem a três versões distintas da obra: a original, uma com a correção manual e outra com a correção tipográfica. Atualmente, todas essas edições são extremamente raras.
No sebo ‘Estante virtual’, exemplares com a correção manual são vendidos por R$ 1.800 e R$ 2.500. A rara edição de 1902 do livro ‘Poesias Completas’, de Machado de Assis, com correção manual, é comercializada a preço elevado no site ‘Estante Virtual’.
O bruxo do velho Cosme não precisaria ter ficado tão preocupado. No fim das contas, poderia ter sido apenas uma traquinagem do demônio Titivillus, famoso na Idade Média por causar erros nos manuscritos dos monges copistas. Ou, quem sabe, ele poderia ter encontrado algum consolo ao descobrir que, em 1768, houve deslize muito mais explícito na folha de rosto.
O livro ‘Obras’, de Claudio Manoel da Costa, ícone do arcadismo, foi impresso com uma curiosa troca de letras, resultando no inexistente e memorável ‘Orbas’. O escritor, ensaísta e bibliófilo brasileiro Eduardo Frieiro, em sua obra ‘Os livros, nossos amigos’, relata um curioso caso de gralha. Ele menciona um obituário de um jornal carioca que trazia a seguinte frase: ‘O honrado Senador…’.
Fonte: © Migalhas
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